sexta-feira, 18 de junho de 2010

Os 15 anos do Remedinho Amargo


O remedinho amargo que marcou a vida de muita gente, inclusive a minha, completou 15 anos no dia 13 de junho de 2010. Fato que quase passou despercebido por mim, se não tivesse descoberto quarta ou quinta da semana passada através da internet. O remedinho amargo a que me refiro é Jagged Little Pill, o terceiro álbum de Alanis Morissette e o primeiro a ser lançado mundialmente.

Em 1997, eu tinha 12 anos e ouvia falar muito em Alanis Morissette, mas era alienado musicalmente e ainda não era adepto da MTV, então não sabia quem era essa figura tão falada. No verão de 1998, ouvi pela primeira vez o álbum Jagged Little Pill, mas as únicas músicas que me chamaram atenção foram You Learn e Ironic. Gostei muita dessas duas músicas e não liguei para o resto do álbum. Logo liguei a música à imagem e descobri quem era a tal Alanis através de vídeo-clipes. Esperava que fosse mais bonita. Em 1999, escutei o Supposed Former Infatuation Junkie, sucessor do Jagged Little Pill, e gostei de quase todas as músicas. A partir deste ano, comecei a me interessar cada vez mais por Alanis e a gravar seus clipes e shows em fitas de vídeo-cassete. Mais para o fim deste mesmo ano, comecei a descobrir mais músicas do Jagged Little Pill, álbum que eu havia subestimado no ano anterior. Em 2000, Alanis Morissette definitivamente já fazia parte da minha lista de artistas favoritos e a admiração se tornou ainda maior depois que assisti um programa sobre sua vida exibido no Multishow. Sua voz me encantava, assim como também a achei simpática e inteligente. Foi impossível ficar imune a Alanis cada vez que descobria a tradução de alguma de suas músicas. A raiva e a indignação após ter sido traída em You Oughta Know e a bela Unsent - a qual alanis compôs usando trechos de cartas que ela nunca enviou para os caras com quem já se relacionou - me fascinaram. Eu nunca tinha visto em minha vida alguém cantar sobre coisas tão íntimas e de certa forma expor tanto a sua vida pessoal em letras de música.

Então decidi que ia comprar o remedinho amargo. Economizei moeda por moeda e comprei-o em um sábado em meados de dezembro de 2000. Lembro-me que comprei de manhã, em um dia que iria posar sozinho em casa. Esperei até a noite para ouvi-lo. E quando ouvi, entrei em transe. Cada música do álbum, com exceção de Mary Jane (hoje em dia gosto desta canção, inclusive acho que de todas da Alanis esta é a em que a voz dela está mais bonita) e Wake Up, me provocavam arrepios. As melodias, os arranjos e os vocais me agradavam enlouquecidamente. Me identifiquei com Perfect, na qual Alanis fala das pressões e exigências que sofremos por parte da família, que está sempre querendo que sejamos os melhores em tudo e nos comparando com outras pessoas. Aquele grito agoniado que ela dá no trecho "why are you crying..." é de arrepiar. A interpretação vocal de Your House é comovente (por mais piegas que essa palavra soe, não há outra para descrever). A indignação raivosa e eloquente de You Oughta Know também foi incrivelmente marcante. Alguns a consideram como o "hino dos amantes rejeitados", afinal quem nunca se sentiu como Alanis nessa música após levar um par de chifres ou um belo pé na bunda? Aliás, toda essa raiva expressada em You Oughta Know fez com que muita gente pensasse que Alanis era lésbica, pois algumas revistas estampavam Alanis na capa e colocavam chamadas como: "Alanis: a mulher que odeia os homens", assim como também diziam que Alanis havia feito um álbum inteiro de ódio aos homens. Totalmente errado. Alanis nunca disse que odiava homens e muito menos fez um álbum inteiro falando que tem aversão ao sexo masculino. Ela apenas fez uma música para expressar sua raiva após ter sido rejeitada. E nem todas as letras de Jagged são raivosas. Algumas são reflexivas, como You Learn e Ironic e há também a balada Head Over Feet, que fala daquele estado patético de encantamento que as pessoas ficam quando estão apaixonadas e quando tudo é novo. Lembro-me que aquele solo de gaita nesta música foi durante anos altamente viciante para mim.

Assim é Jagged Little Pill: um álbum simples e visceral ao mesmo tempo. Vocais na maior parte do tempo gritados e raivosos, mas as vezes suaves também. Os arranjos são simples, vão do pop rock ao rock alternativo, com pitadas deliciosas de grunge. As letras são confessionais e falam sobre os relacionamentos frustrados de Alanis e sua maneira de ver a vida. Hoje em dia quando escuto Jagged, o impacto musical e emocional já não é mais o mesmo. Acho que a produção poderia ser um pouco menos simplória e ter arranjos mais caprichados e iguais aos que os shows de Alanis tinham ao vivo na época do álbum. You Learn na versão de estúdio tem um simplório arranjo pop rock, mas ao vivo ganhava guitarras pesadas e um belo solo de guitarra virtuoso no meio da música. Mas segundo a própria Alanis e o produtor do álbum, Glen Ballard, ser simples era exatamente a intenção do Jagged: as canções eram compostas em menos de 30 minutos e logo em seguida gravadas. 80% do álbum são as demos originais e nenhuma canção era aprimorada, para que soasse crua e visceral. Sem dúvida, um ótimo álbum dos anos 90 e curiosamente outros três de meus álbuns preferidos também são de 1995: (Wha'ts The History) Morning Glory, do Oasis, The Bends, do Radiohead e Mellon Collie and The Infinite Sadness do Smashing Pumpkins.

Ao contrário do que muita gente pensa, Jagged não é o primeiro álbum de Alanis. É o terceiro, porém o primeiro a ser lançado mundialmente. No Canadá, seu país natal, ela já havia lançado dois álbuns: Alanis (1991) e Now Is The Time (1993). Todos dance-music da pior qualidade. Muitos produtores torceram o nariz para o remedinho amargo, até que a Maverick, gravadora da material girl, contratou Alanis e Jagged se transformou num fenômeno de vendas, vendendo mais de 30 milhões de cópias no mundo inteiro. Alanis, depois de Jagged, lançou álbuns totalmente diferentes, decepcionando a muitos de seus fãs. As músicas de estúdio ficaram mais suaves e perderam o peso de antes e suas performances ao vivo já não tinham mais a mesma agressividade dos tempos de Jagged. Toda vez que Alanis lança um álbum os fãs ainda esperam um "Jagged Little Pill II" e se decepcionam quando o resultado é outro. Talvez a maioria prefira a Alanis raivosa à mulher madura e calma que ela se tornou.

Alanis serviu de referência para cantoras que vieram depois, principalmente para Avril Lavigne, cujo timbre de voz em muitas de suas músicas lembra o estilo de Alanis. Mas a própria Alanis, obviamente, também tem suas referências e inspirações. Alguns acham que Alanis copia ou que no mínimo sua voz lembra a de Dolores O'Riordam, do The Cranberries. Sabe aquele estilo de cantar que muitas cantoras tem, com mudanças de voz que vão do grave ao agudo, com ou sem falsetes, e aquela maneira de cantar gritada e raivosamente com um gemidinho no final de uma frase? Para mim, a precursora nesse estilo de cantar é Sinead O'Connor. Recomendo que escute Jackie, Jerusalem e Troy de Sinead O'Connor e notarão essa influência na maneira de cantar de Alanis e Dolores. Sinead, a carequinha nervosa e revoltada, também abriu portas para cantoras e compositoras que cantam visceralmente sobre seus sentimentos.

Por causa das letras confessionais de Alanis, comecei a me interessar por artistas compositores que seguem esse gênero. E então descobri Bob Dylan, que fez um álbum inteiro falando sobre sua separação, o excelente Blood On The Tracks (1973), a própria Sinead O'Connor, que canta sobre os abusos que sofria na infância e também fala sobre a dor da separação na melancólica canção The Last Day Of Our Acquaintance, Billy Corgan do Smashing Pumpkins e Morissey do The Smiths. Ah, e não poderia deixar de falar de uma cantora indie chamada Liz Phair, que infelizmente passou despercebida pelo grande público. Ela lançou seu primeiro álbum em 1993, chamado Exille On Guyville, e também fazia letras pessoais. A mais chocante delas é Flower, em que fala coisas do tipo: "toda vez que vejo seu rosto fico molhada entre minhas pernas, quero ser sua rainha do boquete e transar até seu pau ficar azul...". Perto dela, a letra de You Oughta Know é cantiga de ninar. Sem falar que por causa da Alanis comecei a me interessar por gaita de boca, e descobri artistas como Aerosmith, Bob Dylan e Neil Young.

Por tudo isso que já foi dito, é que Jagged Little Pill marcou minha vida. Como já falei, nunca tinha visto em minha vida alguém que se abrisse tanto em letras de músicas como Alanis. Um excelente álbum que jamais será esquecido. O mesmo impacto que o remedinho amargo teve em minha vida, Little Earthquakes, de Tori Amos, teve na vida de Alanis. Já estou baixando para conferir que impacto terá na minha.

6 comentários:

José Alves disse...

Oi Felipe, gostei do texto e do artigo. Parabéns! Li numa reportagem que a gravadora, quando contratou a então desconhecida Alanis, entregou a ela o álbum genial The Lion and The Cobra, da grande Sinéad O´Connor, e pediu para que ela fizesse algo igual. Você já sabia disso? É verdade? Um abraço.

Fechevarria disse...

Sim, já ouvi falar bastante nesta história, mas acredito que o The Lion and The Cobra tenha sido apenas uma inspiração para o Jagged, e não uma simples cópia descarada.

Wagner. disse...

Valeu cara! Desculpa a demora pra retribuir a visita. Ando tão sem tempo que nem tenho visitado o meu próprio blog rs. Sobre a Alanis, nossa, sem palavras.Simplesmente minha artista favorita,o show da minha vida, o álbum da minha vida. Me amarrei no seu blog. Tem twitter? Me segue lá @rockastico !

Abração

Wagner. disse...

Cara, pelo nome que você passou eu não cosegui te encontrar não. Me encontra por aqui http://www.orkut.com.br/Main#Profile?uid=14813405328036336631 ou pelo nome " Hey, Johnny Park! ", Rio de Janeiro.

Abração!

Anônimo disse...

A história do "The Lion and The Cobra" como referência faz muito sentido. Poxa, "you oughta know" tem uma similariedade lírica muito próxima de "Troy". E aquela música acapela no fim do "Jagged a Little Pill" é algo muito SO'C.

Acho a Alanis original. E acho que ela não existiria se não tivesse uma SO'C antes. O mundo e a indústria fonográfica precisava de cantoras que fossem rock e não roqueiras propriamente ditas, saca? O problema da SO'C é que a carreira dela afundou em 1992; ela passou a ser muito ambient music (como a sua conterrânea da new age: Enya, que até participa do "The Lion and The Cobra"); e o pior de tudo é que se afastou do rock. Daí, a Alanis entrou nessa brecha.

Outro problema da SO'C foi não ter mergulhado na eletrônica e ter ido no jazz, ambient, new age e outros ritmos. Daí, ficou uma brecha. Quem assumiu? Bjork. O produtor Nelle Hopper foi o produtor do "I do not want what i haven't got". Foi o primeiro grande trabalho do produtor e a SO'C não trabalhou mais com ele. Vacilou! Quem colou no Nelle e gravou 3 discos com ele? Bjork. Quando chegou a moda clubber, o Nelle era o produtor queridinho de todos: Garbage, Smashing Pumpkins, Madonna, No Doubt...e Massive Attack.

A SO'C abriu caminho pra Alanis e pra Bjork. E vacilou muito em tentar ser mais uma Enya (etnic music, ambient music, new age), esquecendo a eletronica (trip hop do Nelle Hooper) e o rock (pós-grunge pop do Jagged a Little Pill).

Alanis também abriu espaço para Shakira (Pies Descalços) e a própria Katy Perry no The Lion and The CobraOne of the Boys".

Anônimo disse...

A Alanis abriu espaço pra Shakira (Piez Descalzos), Avril Lavigne, Katy Perry e Lily Allen.